Desinibe, melhora a autoestima, enriquece. O teatro vai muito além disso. O pensamento sensório-motor é caracterizado pelo binômio FAZER e SENTIR, que está na gênese do conhecimento. Afetos, emoções e sentimentos, ao mesmo tempo que desencadeiam ações internas e externas, são também transformadas por estas ações. Esta mobilização estética é o que possibilita a sobrevivência de aprendizagens que constituem simultaneamente conhecimento de si próprio e conhecimento de mundo. É esta dinâmica entre mundo interno e externo a origem da criação de todo conhecimento.
O palco é portanto uma grande escola porque a criança nele se coloca em interação com pessoas e dados culturais que vão lhe constituindo como indivíduo, tendo a estética como propulsora da ação, fazendo com que a cultura se torne seu patrimônio; fazendo com que aprendizagem e geração de conhecimento se aproximem mobilizadas pelo afeto, o que torna a educação significativa em vez de um mero acúmulo de conhecimento.
O tablado é o lugar de socialização das crianças de forma lúdica. Ele próprio dita as regras no sentido de que é um espaço para ser distribuído por todos e onde cada um começa a perceber seu próprio limite. É o espaço do jogo simbólico, da imaginação e da fantasia de forma tão estimulada e permitida que dificilmente se encontra outro tão fascinantemente preparado, salvo alguns “cantinhos da fantasia” em poucas escolas.
O maior poder do palco porém encontra-se na possibilidade da criança adquirir confiança em si mesma. Enfrentar plateia exige autodisciplina e segurança. Portanto, o teatro também é uma boa coadjuvante na cura do medo.
Para nós que fazemos a Escola Sempre-Viva vai ainda além: faz parte curricular da escola, é um meio de fazer nossas crianças aprenderem conteúdos que não seriam tão facilmente absorvidos se não fosse pelo corpo a aquisição de tal conhecimento, como nosso último tema trabalhado, a afrodescendência. Trabalhamos com teatro-dança, não com memorização de texto, visto nosso elenco ser formado por crianças de 2 a 10 anos. Temos este trabalho como um jogo, uma brincadeira com o corpo e a música com uma mensagem emancipadora.
Este ano encenamos “Um Conto Afro-Brasileiro”. Um olhar de carinho e reconhecimento a este grande pedaço do planeta que nos originou. Tão distante vivemos desta maternidade. Um olhar para trás, um zelo ao passado, um resgate de nós mesmos enquanto civilização, um religar a nossa história.
(Artigo originalmente primeiramente publicado no jornal Contraponto em dezembro de 2013)